quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Sobre retornar, para um Brasil diferente

O grupo de Fulbrighters que está agora nos Estados Unidos sem dúvida assiste de perto a um momento peculiar da história norte-americana com a eleição de Donald Trump à presidência. Em Nova York, minha cidade de residência, historicamente democrata, o clima era de consternação e revolta após o resultado.

Um dia depois do anúncio da vitória de Trump, eu fui a um workshop sobre ações de equidade racial e justiça social no Queens College, que é um dos campi da City University of New York (CUNY), onde estou alocada como pesquisadora visitante. A ministrante, Dra. Caty L. Royal – mulher, negra e acadêmica – não pôde começar o workshop sem falar sobre a eleição, assunto que estava na boca de todos presentes.

Então ela disse algo assim: “Esta não é a primeira vez que esse país será dirigido por conservadores. Na verdade, isso ocorreu em grande parte da nossa história. Por isso hoje eu não vou chorar. Eu vou levantar a cabeça e continuar pensando, atuando e incomodando”.

Depois, completou, mais ou menos assim: “Vocês acham que porque eu sou doutora tudo mudou? Há pouco tempo eu entrei num prédio e quando eu fui me anunciar na recepção me mandaram para a cozinha. Mas eu não desisto de lutar, eu sigo em frente”. E assim esta brava mulher foi merecidamente aplaudida por jovens das mais diferentes origens étnicas e sociais, grande parte deles com lágrimas se equilibrando nos olhos.

Enquanto Dra. Caty falava, eu refletia sobre os Estados Unidos, mas especialmente pensava no meu próprio país. Eu deixei o Brasil exatamente no dia em que o impeachment da presidente Dilma Roussef se concretizou. E quem achou que seria apenas uma troca de governo não poderia estar mais enganado. Independentemente de posições políticas, muita coisa mudou e ainda vai mudar para todos nós.

Todo Fulbrighter precisa pensar na volta, afinal, a gente vive essa experiência de intercâmbio acadêmico já com data certa para retornar. Mas talvez para o grupo que está aqui neste momento refletir sobre isso seja algo mais recheado de tensões.

Ontem recebemos a notícia de uma profundamente triste tragédia aérea que ceifou a vida de esportistas e jornalistas. Enquanto o país vivenciava esse luto, na calada da noite, nossos políticos estavam trabalhando, porém, não para nós, mas sim contra nós. Manifestações populares tomam as escolas, as universidades e as ruas e são não só reprimidas com violência, mas sobretudo ignoradas em seu valor constitucional.

Meu marido outro dia me relembrou de uma frase: “Libertei mil escravos. Podia ter libertado outros mil se eles soubessem que eram escravos”. A fala é atribuída à abolicionista norte-americana Harriet Tubman. Com essa frase ecoando em minha mente, sigo hoje entristecida, entretanto, atuando, pensando e, sobretudo, esperando incomodar bastante.

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Viver intensamente o ambiente universitário

Campus da University of Washington em Seattle, WA
Essa é a primeira vez que sou estudante em tempo integral, desde que entrei para a universidade. Na graduação em Biblioteconomia estudei e trabalhei durante os 4 anos do curso. Entrei para o mestrado meses depois de começar a trabalhar, foram dois anos muito intensos. E o primeiro ano do doutorado foi cursado conciliando meu trabalho como bibliotecária e docente. Entre muitas noites sem dormir, viagens, leituras, idas e vindas, aqui estou.

Ser estudante em tempo integral e "viver" a universidade sempre foi um desejo meu. Nesses três meses como Visiting Student na University of Washington posso dizer que tenho vivido a universidade ainda mais do que imaginei. De palestras a jogos de basquete, tenho aproveitado todas as oportunidades de ser uma estudante de doutorado. Por isso, gostaria de compartilhar algumas dicas para que esa jornada seja também prazerosa.

Estabeleça uma rotina: como estudante de mestrado ou doutorado seu principal objetivo é a pesquisa. Por isso, estabelecer uma rotina é essencial para chegar a esse objetivo. Diariamente, eu vou ao office dos alunos de doutorado ou à biblioteca para desenvolver minhas atividades de pesquisa. Essa é uma boa oportunidade para conhecer outros alunos, conversar e até mesmo estabelecer novas parcerias de pesquisa. Também me envolvi em um grupo de pesquisa coordenado pelo meu orientador e tenho assistido a algumas aulas vomo ouvinte. Tudo isso, ajuda muito a conhecer a dinâmica universitária e se integrar.

Reconheça suas áreas de interesse: um olhar interdisciplinar é fundamental para a produção de conhecimento. Muitos projetos importantes são desenvolvidos entre profissionais de diferentes áreas do conhecimento. Identifique as área potenciais que com as quais sua área de pesquisa pode dialogar.

Mantenha-se atualizado sobre os eventos: uma vez reconhecidas suas áreas de interesse, você pode buscar os eventos promovidos pelos diferentes departamentos. Diariamente, há palestras, paineis, grupos de discussão, seminários, etc acontecendo por todo o campus. A dica é acessar a página dos departamentos e bibliotecas, seguir a conta no twitter, assinar a newsletter, ficar atento aos cartazes na universidade, acompanhar listas de discussão, etc. Sempre que encontro um evento interessante, adiciono à minha agenda, não consigo participar de todos, mas, estabeleço prioridades e quando tenho um tempo livre não perco a oportunidade.

Amplie sua visão: a minha área de pesquisa é especialmente aberta para a interdisciplinaridade, o que aumenta minhas opções. Já participei de eventos sobre as eleições presidenciais no Departamento de Ciências Política e no Departamento de Comunicação, Big data na iSchool e no Centro de Estudos em Demografia e Ecologia. Ainda assim, consegui fazer muitas relações com minha área de atuação e acredite, não foi perda de tempo.

Frequente atividades culturais e esportivas: a vida esportiva nas universidades americanas é intensa, não é difícil se integrar e ser contagiado pelo espírito da torcida. As atrações culturais também fazem parte do ambiente universitário. Os departamentos de música, artes, letras e a bibliotec são os principais lugares para buscar informação sobre os mais diversos espetáculos.

Essas pequenas ações tem me ajudado muito a viver intensamente essa oportunidade intercâmbio acadêmico e cultural. Hoje mesmo participei de um painel sobre o papel das mídias tradicionais e mídias sociais nas eleições presidenciais de 2016. Era um evento voltado, especialmente, para o pessoal da comunicação. Lá estava eu refletindo e, já na primeira palestra, surgiram várias ideias e estabeleci ligações com a Biblioteconomia e Ciência da Informação.

Ao refletir no caminho de volta para casa, percebi que era o momento de escrever este post e compartilhar a sensação cr que mergulhar no ambiente universitário pode nos fazer muito bem e despertar esperança mesmo nos momentos mais difíceis da nossa história.